José Roberto de Castro Neves estreia na ficção com livro de tragédia à brasileira

Conhecido pelo trabalho no direito e por ensaios literários, José Roberto de Castro Neves estreia na ficção com um romance que busca passar por séculos e camadas da identidade brasileira.

“Ozymandias”, lançado pela editoria Intrínseca, chega às livrarias como uma obra que recusa a linearidade e propõe uma narrativa fantástica sobre formação do Brasil —com ecos de Shakespeare, mitologia iorubá e música popular brasileira.

Ambientado na fictícia cidade de Ateninhas, o romance acompanha gerações da família Lutero, espécie de dinastia patriarcal que domina o povoado desde a colonização até os dias atuais. Mas não há heroísmo na condução do poder. “É uma história sem heróis. Todos os personagens têm suas questões e dificuldades. Ninguém consegue se libertar do próprio destino”, afirma o autor.

A frase resume bem o espírito do livro. Para Castro Neves, “Ozymandias” é “uma tragédia grega que se passa no Brasil”. As páginas não têm números de acordo com uma decisão do próprio autor: “Quis dar ao leitor o tempo do livro, permitir uma viagem sem limitação do tempo. A história não é contada em linha reta.”

Entre as dezenas de personagens estão uma jovem em fuga que se aproxima de uma verdade trágica, uma parteira movida por vingança e uma imigrante italiana dividida entre o marido e o amante.

As tramas se entrelaçam por meio de Metinques —ou “me thinks”, como brinca o autor—, bibliotecário e narrador da história. A biblioteca, aliás, é uma metáfora central da obra. “Imagine um lugar onde os livros desaparecem e as mulheres se tornam inférteis. É o que acontece quando não cuidamos da cultura e das nossas origens.”

A ideia do destino percorre toda a narrativa. Castro Neves vê nisso uma herança clássica e um problema moderno. “Escapar do destino é o sonho do homem contemporâneo. Mas isso talvez seja impossível.” A culpa, também recorrente, ecoa Shakespeare, Dostoiévski e a própria Bíblia: “Está em Macbeth, em Crime e Castigo, em Adão e Eva. É estrutural”, diz o autor.

O título do livro, que acaba por nomear também sua protagonista, remete ao poema homônimo de Percy Shelley, publicado em 1818. Na obra, um viajante encontra no deserto os restos de uma estátua colapsada, vestígios do império de um faraó que acreditava ser eterno.

Segundo Castro Neves, é uma reflexão sobre o poder, a passagem do tempo e a necessidade de humildade diante da existência —temas centrais também em “Ozymandias”.

Com referências que incluem a tragédia grega e a música popular brasileira, “Ozymandias” aposta no repertório cultural do leitor e se afasta, deliberadamente, de soluções óbvias. “Não há nada à toa no livro. Cada elemento tem sua função simbólica.”

O autor parte de Dante e Virgílio para citar trechos de Roberto Carlos e Beto Guedes, compondo um panorama híbrido da cultura nacional. “Essa mistura é o Brasil”, pontua Castro Neves.

Professor universitário há 30 anos que se descreve como “um leitor compulsivo, quase patológico”, Castro Neves acaba de enviar sua candidatura à Academia Brasileira de Letras, para a qual tem boas chances de ser eleito no próximo dia 29, segundo acadêmicos. Ele ocuparia a cadeira 26, deixada vaga por Marcos Vilaça.

“É um sonho, um lugar de pessoas incríveis. Seria uma grande honra”, diz.

noticia por : UOL

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